O acesso à
diversidade cultural e à cultura tradicional dos povos é um dos focos do blog e
do Instituto Cultural Arte Brasil.
Assim é com
grande satisfação que o músico, escritor e jornalista Aldo Moraes realiza uma
importante entrevista com a londrinense Priscila Kuniyoshi, integrante do grupo
de tambores Eisa.
O que é
Eisa, sua importância na tradição japonesa, o trabalho realizado em Londrina e
planos para o futuro do grupo são aspectos abordados na entrevista.
Olá Priscila, fale um pouco de como foi sua
infância e suas primeiras impressões sobre a cultura japonesa:
Meu avô, nascido no Japão, sempre fez questão de
manter as tradições japonesas em nossa família, mas ao mesmo tempo, ele nunca
foi tão rigoroso a ponto de se fechar para a cultura brasileira. Então sempre
foi uma mistura, de idiomas, comidas e costumes. A escola que freqüentei
durante a Educação Infantil ensinava japonês e português. E depois, a partir do
ensino fundamental era de manhã a escola regular e à tarde (todos os dias) a
escola japonesa. Infelizmente na época, a metodologia de ensino do idioma não
ajudava muito, mas mesmo assim pude aprender muitas coisas, das quais considero
como mais importantes a estrutura educacional (que buscava reproduzir a
japonesa) e a valorização da cultura e da arte. Pintura, dança, canto,
instrumentos musicais entre outras atividades foram sempre muito valorizadas na
educação formal japonesa, e essa prática esteve muito presente na minha
infância, influenciando minha educação e formação de forma considerável. A
diferença com a educação formal brasileira era claramente perceptível, e
englobava inclusive aspectos como a limpeza da escola, realizada pelos próprios
alunos.
Enfim, cresci nesse meio… em uma família brasileira
mas que sempre fez questão de manter alguns dos costumes da cultura japonesa e
que nunca esqueceu de suas raízes.
Como é sua relação com a música em geral e em
especial com Eisa?
Sempre cresci no meio da música, justamente por
influência da cultura japonesa, tanto na escola quanto em casa. A dança, a
prática de instrumentos musicais e o famoso karaokê sempre esteve presente em
festas, tanto familiares quanto da comunidade japonesa.
A minha relação com o eisa surgiu um pouco mais
tarde. Conheci mais a fundo quando tive a oportunidade de estudar em Okinawa,
no Japão. Por se tratar de uma manifestação cultural específica da ilha de
Okinawa foi lá que pude entender um pouco mais dessa arte extremamente
tradicional que me encantou por sua singularidade.
Fale um pouco do conceito de Eisa e sua
experiência com o grupo de Londrina:
O eisa é uma arte originária da ilha de Okinawa
(província ao sul do Japão) composta de variações de taikos (tambores) e outros
instrumentos, além da música e dança características da ilha.
Os tambores de Okinawa, diferentemente dos outros
estilos, possui uma batida cadenciada, geralmente alternando entre uma e duas,
repetição esta que remete às batidas do coração.
Em Okinawa, durante as festividades de finados acredita-se que os espíritos dos antepassados regressam ao seio da família. Assim, todas as vilas de Okinawa são tomadas pelos grupos de eisa que se deslocam de casa em casa ecoando as batidas de seus tambores e celebrando o momento da despedida quando os espíritos deixam seus familiares e regressam ao mundo dos mortos. Esse ecoar leva a mensagem aos antepassados para que retornem no ano seguinte para reencontrar seus descendentes, carregando o preceito do desejo de manter a linhagem familiar unida. Acredita-se que a simulação das batidas do coração por meio dos tambores transfere aos espíritos a paz primordial e o desejo de retorno.
Em Londrina o grupo teve seu início no final de
2007, por iniciativa de pais e jovens da Associação Cultural e Recreativa
Okinawa de Londrina (ACROL) no intuito de propiciar uma atividade cultural
principalmente para crianças. O então Grupo Ryukyu Damashi (Espírito de
Okinawa) treinava com o auxílio de vídeos vindos de Okinawa, devido a falta de
professores ou pessoas que pudessem ensinar a arte. Durante muito tempo muita
coisa foi improvisada, desde instrumentos para treinos até vestimentas para as
apresentações, tudo no intuito de chegar o mais próximo do real, pois a
dificuldade em se conseguir materiais típicos da ilha era muito grande.
Nesta época já se passava o ano de 2008, ano de
comemoração do centenário da imigração japonesa no Brasil, o que favoreceu para
que o grupo crescesse, ficasse mais conhecido no meio nikkei da cidade e
aumentasse consideravelmente em número de integrantes. Neste momento nasceu
então o desejo de se filiar a um grupo maior, que pudesse oferecer um respaldo
tanto técnico quanto filosófico. Assim, em setembro de 2009 o antigo Ryukyu
Damashi passou a fazer parte de uma família maior, tornando-se Ryukyu Koku
Matsuri Daiko – Filial Londrina.
Atualmente a Filial Londrina conta com cerca de 100
integrantes, mantendo a mesma filosofia de sua matriz, que se preocupa além dos aspectos culturais a serem
difundidos, principalmente com a formação da criança/jovem. Através dos
ensinamentos da cultura e da filosofia japonesa, procura oportunizar o
aprendizado de habilidades importantes tanto para a vida pessoal quanto
profissional do indivíduo, levando ao longo de toda a vida.
Você chegou a estudar no Japão. Conte como foi
isso:
Desde pequena eu sempre tive vontade de conhecer o
Japão, mais especificamente Okinawa, terra natal do meu avô e dos meus bisavós.
Na verdade era um daqueles sonhos de criança, que se imagina mas não se tem a
dimensão das dificuldades e muitas vezes nem a real pretensão em se realizar.
Muito por acaso, depois que entrei na UEL, fiquei sabendo de uma bolsa de
estudos que existe devido a um convênio entre universidades, justamente em
Okinawa. Naquele momento não pensei duas vezes. Me inscrevi, prestei a prova,
fiz a entrevista e fui aprovada para freqüentar a universidade e estudar lá.
A experiência foi indescritível… Uma ilha
maravilhosa, com praias paradisíacas e uma população extremamente receptiva, um
tanto quanto diferente do restante do Japão. Uma cultura riquíssima, cheia de história
em um arquipélago de quase 170 ilhas mas que totaliza pouco mais que 2.200 km². Tive então, a oportunidade de finalmente
conhecer o local onde meus antepassados haviam nascido, entender um pouco mais
sobre nossas tradições e cultura. Estudei japonês, aprendi um pouco sobre a
dança e o sanshin (instrumento tradicional), mas mais que isso, pude vivenciar
o dia a dia da vida de um okinawano, além de ter contato com pessoas de vários
países do mundo que estavam lá também para estudar. Essa convivência, oportunizada
pelo compartilhamento do alojamento da universidade, me proporcionou um
aprendizado adicional, sobre a cultura e as curiosidades de muitos outros
países.
Quais os eventos e shows do grupo Eisa para
2018?
Todos os anos temos muitas apresentações em
variados eventos, principalmente da comunidade japonesa. Para este ano os
principais serão: Japan Fest (Marília), Expo Japão, Okinawa Matsuri, Show de
Comemoração do IMIN 110, Festival do Japão (São Paulo), Eisa Pageant, Londrina
Matsuri e Nipo Fest.
O que você ouve de música brasileira?
Eu gosto bastante de MPB e bandas de POP/ROCK
brasileiro como Paralamas, Skank, Capital, entre outras.
Agradeço sua entrevista e peço que deixe um recado
ao nosso leitor:
Foi um grande prazer poder compartilhar um
pouquinho sobre a minha história e a do nosso grupo. Se você gostou e tem
interesse em saber um pouco mais, assistir a um treino ou apresentação, ou até
fazer parte, entre em contato conosco no e-mail londrina@matsuridaiko-brasil.com.
Muito obrigada ao blog por esta oportunidade.
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