a) Aldo pergunta: Olá
Cientista é um prazer ter você falando com o público do blog Arte Brasil.
Conte-nos um pouco de como se interessou por música.
Cientista responde: O prazer é recíproco Aldo.
Acho que fui uma criança criativa, inventava minhas
brincadeiras e sonhava muito.
Uma vez a turma que estudava no ensino fundamental foi
visitar uma igreja vizinha à escola e tinham vários instrumentos montados
inclusive uma bateria e fiquei fascinado.
Mas foi só depois de muito tempo, quando conheci a
cultura Punk que eu vi que também podia me expressar artisticamente, seja na
música, nos fanzines e em várias coisas através do “faça você mesmo”.
b) E como foi
chegar a montar a primeira banda?
Eu tinha muita vontade para montar uma banda, ia a
vários shows e ensaios de bandas que fui conhecendo. Mas não sabia tocar nada,
não tinha instrumentos e não tinha grana pra isso. Minha família sempre me deu
muito carinho, educação, lugar pra morar e alimentação, mas não tínhamos
condição de investir nisso.
Tive que me virar e com criatividade montei a primeira
banda, que foi a Desordem e Regresso, em 1987. Tocávamos Punk Rock e Hardcore,
e como sempre a banda não teve a repercussão que merecia.
E assim fui superando as dificuldades uma a uma e
depois de “muitos anos” de luta hoje finalmente tenho a estrutura que sonhava,
mas foi tudo na base de muitos sacrifícios.
c) Como era o
cenário nos anos 80 em Londrina para fazer rock?
Era muito mais difícil tocar em uma banda de Punk Rock
nessa época, tínhamos o preconceito do público, dos poucos organizadores de
eventos da época e até da maioria das outras bandas, hehehe. Mas como tudo da
vida você tem que acreditar em você mesmo, e criamos uma rede de contatos muito
grande e tivemos o reconhecimento nacional, dentro desse microcosmos.
Produzi duas demos da Desordem e Regresso, depois
criei a Hard Money que ajudou muito no fortalecimento do cenário underground
londrinense, criei o selo LAB REC que lançou vários CDS e recentemente dois
DVDs. Continuo tocando, agora com a Surface (desde 1997) que lançou 4 CDs e um
DVD. Desde a época que comecei no underground londrinense vi muitas bandas
surgirem, mas a maioria nunca lançou nada, muitas nem criaram musicas próprias e
algumas delas não duraram nem um ano. Se fosse fácil todo mundo faria, por isso
acho que o reconhecimento local para as poucas bandas que conseguem realizar um
trabalho sério é muito pequeno.
d) Sei que você documenta a história do rock em Londrina.
Como é este trabalho e quando começou?
Desde que conheci a cultura Punk passei a ser
protagonista da história, e não apenas um mero telespectador. E assim procurei
guardar e registrar essa nossa trajetória, mas deve ser difícil para as novas
gerações entenderem que até para tirar uma simples foto antes era algo bem
complicado (para os meus padrões da época). Guardei cartazes, originais de
fanzines, panfletos, etc, além de algumas poucas fotos. Filmagem então era algo
de outro mundo, por isso realizamos poucos registros em vídeo no começo.
Em 2008 veio a ideia de produzir um DVD contando um
pouco da história da banda Hard Money e de outras histórias do underground
londrinense. Comecei a organizar o material que tinha e buscar mais coisas. Fiz
um roteiro e busquei os meios pra executar o projeto. Conclui em 2011, pois
além de ser algo muito trabalhoso, quando você banca um projeto cultural
somente com o dinheiro do bolso as coisas demoram um pouco mais.
O resultado foi muito bom, muitas pessoas conseguiram
reviver aqueles áureos anos do underground londrinense e quem não ainda
conhecia saber dessa história. Foram mais de 500 DVDs divulgados em todo país e
alguns para o exterior. Agora em 2014 lancei uma edição especial desse
trabalho, com mais 4 vídeos extras.
E agora lancei o DVD/CD SURFACE “ANVERSO” , que de
certa forma da continuidade ao registro histórico que comecei no DVD anterior
(HARD MONEY “do it yourself”),é um trabalho bem mais complexo.
e) Agradeço
ter ganho de você o DVD e CD da banda Surface com o show gravado no Teatro
Zaqueu de Melo. Vi a força da banda e das músicas autorais. Como manter o pique
depois de tantos anos?
Acho que todo artista é meio doido, precisa abstrair a
realidade pra conseguir realizar as coisas. Temos pouquíssimo reconhecimento em
nossa própria cidade, não ganhamos dinheiro com isso, além de várias outras
dificuldades e mesmo assim o prazer de continuar tocando e criando somado ao reconhecimento
que recebemos de outros lugares nos motivos a realizar a melhor produção desses
meus 30 anos quase de underground.
Com certeza o DVD/CD SURFACE “ANVERSO” foi a produção
mais difícil que realizei na vida, por enquanto. Foram 3 anos de um produção
minuciosa, um alto investimento e muita paixão. O DVD contém um show gravado ao
vivo no Teatro Zaqueu de Melo, outro vídeo onde contamos um pouco da história
da banda e alguns extras. O CD foi gravado no estúdio 3EM1, um dos melhores
estúdios da região. A produção teve o patrocínio do PROMIC (Prefeitura de Londrina) e um investimento
grande do próprio bolso, mas o resultado valeu a pena.
f) O punk
rock e o hard core trazem em si muito de contestação ao capitalismo desenfreado
e as questões sociais. Como enxerga a trajetória do Brasil neste contexto dos
anos 80 a 2014?
Contestar o capitalismo é muito mais que falar mal dos
políticos e de como a sociedade está organizada, é tentar viver de forma
diferente do padrão, é fazer ações que não seguem a lógica do capital. É ter
iniciativa e fazer as coisas acontecerem, fazer arte, sem ter como fim o lucro,
mas a realização de algo prazeroso. Por isso vejo que o Punk trouxe essa visão
“alternativa” para um monte de gente. Não é fácil ser diferente, pois fomos
educados para agir sob a óptica capitalista, por isso é um desafio diário.
g) Você é uma
referência cultural para todos que atuamos na cultura e agradeço dispensar
parte de seu tempo para falar com nosso blog. Deixe o espaço livre para você
falar com nossos leitores.
Eu que agradeço Aldo pela oportunidade. Todos os
projetos que realizo faço com paixão, quem não sente isso ao realizar as coisas
jamais conseguirá entender. Por isso espero que as pessoas se interessem mais
em adquirir minhas produções, pois assim eu me motivo pra realizar outros
projetos. Se já realizei tudo isso com pouquíssimo apoio (principalmente por
parte do público londrinense) imagine o que conseguiria fazer com o apoio
devido? Continuarei esse trabalho enquanto puder e espero que um maior reconhecimento
venha enquanto estamos vivos... depois não adianta muito, hehe
Nenhum comentário:
Postar um comentário