quarta-feira, 28 de maio de 2014

COMPOSITOR RICARDO TACUCHIAN TOMA POSSE NA ACADEMIA BRASILEIRA DE ARTE

T A C U C H I A N 7 5

Posse de Ricardo Tacuchian na Cadeira nº 39 (Antonio Carlos Gomes) da ACADEMIA BRASILEIRA DE ARTE

1. Assinatura do livro de posse (com o Acadêmico Victorino Chermont de Miranda)

 2. Membros da Academia Brasileira de Arte (Acadêmicos Sergio Fonta, Maria Helena de Andrade, Victorino Chermont de Miranda, Israel Pedrosa, Heloisa Aleixo Lustosa, Ricardo Tacuchian e Vasco Mariz)

 3. Saudação ao novo Acadêmico Ricardo Tacuchian feita pelo Acadêmico Vasco Mariz

SAUDAÇÃO A RICARDO TACUCHIAN EM SUA POSSE
NA ACADEMIA BRASILEIRA DE ARTE

Vasco Mariz
Senhora Presidente Heloisa Lustosa,
senhores Academicos, senhoras e senhores:
Agradeço o honroso convite que me foi feito pelo maestro Ricardo Tacuchian para fazer a saudação ao novo acadêmico na sua cerimônia de posse. Lembro-me bem da minha posse em 1988, realizada nos salões da Academia Brasileira de Letras. Dois novos acadêmicos tomavam posse Antonio Fantinato Filho, ilustre diplomata considerado um de nossos melhores poetas do século XX, e eu. Coube-me fazer o elogio do maestro José Siqueira, prolífico compositor e criador da Orquestra Sinfônica Brasileira, recém falecido e que havia sido um bom amigo meu. Foi uma bonita cerimônia em black-tie.e com publico numeroso.

 Depois da longa presidência de Agenor Rodrigues Valle, na qual nossa entidade entrou em declínio progressivo, um pequeno grupo de valentes acadêmicos teimou em reunir-se periodicamente visando manter viva a chama. Fazíamos reuniões em residências privadas dos acadêmicos, nas quais alguns participantes faziam pequenas palestras sobre assuntos de sua especialidade e debatiamos com ardor os temas em pauta. Eu mesmo proferi uma mini-palestra em uma dessas agradáveis reuniões, por vezes muito divertidas e onde ocorreram até vibrantes tertúlias. Depois houve uma pausa, longa demais talvez, após a morte de Agenor, que deixaria menos saudades do que se poderia supor. Felizmente, dois devotados academicos, Heloisa Lustosa e Victorino Chermont de Miranda, persistiram no esforço de tentar levantar a Academia Brasileira de Arte, que afinal conseguiram reviver em 2012 com a comemoração dos 70 anos anos da Academia na residencia de Maria Beltrão, e a concorrida posse de Evandro Carneiro e o lançamento do 1º informativo da ABA. Em 2013 foram preenchidas vagas existentes com personalidades representativas, seguida de diversas cerimônias de posse e eventos. E aqui estamos esta tarde para a posse de um ilustre novo membro de nossa entidade, o maestro Ricardo Tacuchian, um dos mais importantes compositores brasileiros contemporâneos, que aliás acaba de receber importante homenagem em São Paulo.

Nascido no Rio de Janeiro em 1939, Ricardo Tacuchian graduou-se na Escola de Música da UFRJ em piano, regência e composição. Seus principais mestres foram José Siqueira, Francisco Mignone e Claudio Santoro. Na década dos 70 criou o Conjunto Síntese, dedicado à música medieval e renascentista e à música contemporânea, executada com instrumentos antigos e foi um dos fundadores e primeiro regente do Ensemble Ars Contemporanea, com o qual estreou a maioria de suas obras daquela época. Aperfeiçoou-se em regência com Hilmar Schatz, Francisco Mignone e Swarowski e, mais tarde, frequentou a University of Southern California, onde conquistou seu doutorado.

 Tacuchian foi professor da Escola de Música da UFRJ onde lutou contra a sua estrutura conservadora e acadêmica da época, e foi o introdutor da música contemporânea em sua programação. Naquela Escola criou o Panorama da Música Brasileira Contemporânea, séries de concertos com boa repercussão nacional. Foi também o criador da disciplina “Música Brasileira”, com o objetivo de levar aos jovens um melhor conhecimento de nossa música do passado e do presente. Assumiu cargos administrativos na UFRJ (Chefe de Departamento e Coordenador de Pós-graduação) e, mais tarde, na UNIRIO (Pró-reitor de Pós-graduação e Pesquisa). Foi regente da Orquestra Sinfônica da UNIRIO e em 1985 Tacuchian regeu, na Praça da Apoteose, RJ, o maior conjunto instrumental da história do Brasil: uma banda com 2.000 músicos.

 Ricardo compõe desde criança e já aos 23 anos se apresentava oficialmente como compositor em concerto público, com a Imagem carioca (em sua antiga versão para orquestra de cordas, depois substituída por uma versão sinfônica e outra ainda para banda). Mais tarde fez uma nova versão dessa mesma peça para quarteto de violões. Sua obra desde os anos 60 segue uma estética predominantemente nacionalista, mas, nos anos 70. o compositor abraçou uma linha experimental, usando diferentes técnicas das vanguardas da época. Nesta fase vanguardista, creio que a melhor contribuição de Ricardo Tacuchian foi a série de oito peças intituladas Estruturas. A partir dela, definiu sua nova linguagem musical. Cada obra tem um qualificativo, pois considera o adjetivo como o aspecto subjetivo da comunicação com seu público. Teve sempre em mente ser indispensável ao ouvinte um “gancho” no qual ele possa se apegar para recordar uma obra. Passo a comentar a importante série das Estruturas.

   Estruturas sincréticas (1970) é a primeira peça da série, alcançando êxito em sua estreia pelo Ensemble de Sopros e Percussão da banda do Corpo de Bombeiros do RJ, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Já as Estruturas simbólicas (1973) é “uma das produções aleatórias nacionais de melhor acabamento formal”, na opinião do então critico e compositor Ronaldo Miranda. As Estruturas obstinadas de 1974, foi uma das primeiras peças no Brasil a apresentar a estética minimalista; Estruturas primitivas (1975) representa uma tentativa de unir elementos tradicionais às últimas tendências contemporâneas. Estruturas sinfônicas (1976), estreada pela OSB, dirigida por Isaac Karabtchewsky, agradou sobretudo pelo primeiro movimento. Essas Estruturas Sinfônicas são um dos trabalhos de maior fôlego de Tacuchian. Estruturas verdes (1976), para violino, violoncelo e piano, revela, pioneiramente na música brasileira, uma preocupação com a ecologia. Estruturas divergentes (1977), para flauta, oboé e piano, mostra o choque de forças opostas, uma metáfora política ao regime político daquela época. Finalmente, chegamos às Estruturas gêmeas (1978) para piano a quatro mãos. É uma homenagem a compositora Ester Scliar, então recém-desaparecida, de quem se sentia quase como um irmão.

 Ricardo Tacuchian é um compositor que avança seguro de seus passos. Tem excelente métier e considerável experiência. Vem atuando intensamente no meio musical carioca e seu mérito como compositor e organizador é reconhecido por todos. Em 1981 foi eleito para a Academia Brasileira de Música, e ocupou a presidência desta entidade por duas vezes (1993/7 e 2006/9), ocasião em que promoveu uma necessária reformulação administrativa e artística da entidade. Nos anos 80, Tacuchian superou as polaridades tradicionais da música brasileira (nacional/universal; velho/novo; tonal/atonal; e outras) e enriqueceu seus recursos sonoros como compositor pós-moderno, isto é, preocupado com a inovação, mas sem negar a tradição. Duas peças são paradigmáticas desta nova postura: o noneto Rio/L.A. (1989) e o balé para orquestra sinfônica Hayastán (1990), ambas escritas no período em que o compositor viveu em Los Angeles (1987-1990). O noneto Rio/LA, estreada nos EE. UU., em 1990, reflete o vigor de duas megalópoles Rio de Janeiro e Los Angeles e nele emprega instrumentos pouco comuns em música de concerto, tais como o baixo elétrico, a cuíca e o agogô. De outra parte, elementos de jazz, samba e pop music estão interligados numa estrutura em permanente transformação e dentro das técnicas composicionais contemporâneas. O bailado Hayastán marca a herança armênia do compositor com temas da região.. Ainda nos EE.UU. compôs Prisma (1989) uma das obras nacionais pioneiras criadas com auxilio do computador.

 Entre as peças de câmara de Ricardo, agrada-me muito Light and Shadows (1988), dedicada a mim, e estreada na Califórnia. Foi incluída no Panorama da Música Brasileira Atual de 1992, onde foi recebida com muitos aplausos. O autor já havia experimentado em Texturas, para duas harpas, e em Transparências (ambas de 1987), para vibrafone e piano, a expressão musical de elementos plásticos e obteve então uma bem realizada representação musical de grandezas visuais de luzes e sombras.
Tacuchian vem usando ultimamente em sua obra o sistema T, uma técnica de controle de alturas inventada por ele próprio. A partir de 1990, vem escrevendo nesse sistema, que se consolidou na peça Giga Byte (1994), para 14 sopros e piano obbligato, estreada no Rio de Janeiro no mesmo ano e depois reapresentada na Bienal de 1997. Saliento também Terra aberta (1997), para soprano e orquestra, de belo efeito vocal. Foi encomenda da Prefeitura carioca para comemorar a visita do papa João Paulo II ao Rio de Janeiro e já está gravada em CD em selo Rio-Arte (OSB, Ruth Staerke, soprano e Roberto Tibiriçá, regente).

 Sobre os trabalhos mais recentes de Tacuchian, lembro o Quarteto de Cordas nº 3 (1983), composto em Bellagio, lago de Como, Itália, a convite da Fundação Rockefeller, e estreado em Milão com muito agrado, e o Quarteto de Cordas nº 4, escrito e estreado em 2011, na XIX Bienal de Música Brasileira Contemporânea. Em 2000 escreveu a Toccata Sinfônica, interpretada pela OSESP, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, pela Sinfônica do Paraná e pela orquestra da Petrobras-Pró Música. Em Curitiba foi homenageado pela Escola de Música e Belas Artes e pela Universidade Federal do Paraná.

 Em 2002, escreveu Três Cantos de Amor sobre poemas de Carlos Drummond de Andrade e apresentados em Bayreuth, Viena, Berlim e Londres. No ano seguinte, Ricardo compôs Assim contava o Baiá, uma cantata para barítono, piano, flauta, celo e percussão. Ela foi apresentada pelo Bremen Ensemble em várias capitais europeias, além de Belém e Manaus.

 Entre as suas obras mais importantes dos últimos anos, saliento o Concerto para violão e orquestra, encomendado por Turíbio Santos e por ele estreado e gravado em 2010 (versão para cordas). Na versão para orquestra sinfônica, veio a ser estreado por Dimitri van Halderen, em 2011, na Espanha. Lembro ainda Biguás, para orquestra, encomenda da Petrobras para o grande concerto comemorativo dos 50 anos do falecimento de Villa-Lobos. Biguás foi estreada na Sala Cecília Meireles em 20 de novembro de 2009 (Orquestra Petrobras Sinfônica, regida por Ricardo Rocha);. Recordo também O Filho da Floresta (2007), para soprano e orquestra, estreada na XVIII Bienal de Música Contemporânea do Rio de Janeiro, em 2009, pelo maestro Ernani Aguiar e o soprano Veruschka Mainhard com a orquestra sinfônica da UFRJ.

  Tacuchian, que já teve sua obra apresentada na Rússia, Armênia e em praticamente todos os paises da Europa e, nas Américas, participou de importantes Festivais Internacionais, tanto na Europa como nos Estados Unidos e América Latina. Escreveu ainda para orquestra sinfônica (com ou sem solistas) Toccata Sinfônica (2000), Fanfarra Campesina (2005), Filho da Floresta (2007),e Le Tombeau de Aleijadinho (2011). Saliento entre suas mais recentes obras a Sinfonia das Florestas (2012),estreada na Espanha, obra de grandes proporções, para orquestra sinfônica e soprano solo, em quatro movimentos: 1. Amazônia; 2- Cerrado; 3- Queimadas; e 4- Mata Atlântica.

 Ricardo acredita que a criação musical deve conciliar elementos racionais com elementos subjetivos do compositor. Ele é um compositor de repertório e não uma “glória de festival”, como se contentam alguns de seus colegas. . Talvez por isso é que, aos setenta e cinco anos de idade, é um dos autores mais frequentemente interpretados no Brasil e no exterior.e um dos maiores compositores brasileiros contemporâneos. Sua discografia alcança 72 itens, em cerca de 36 CDs, gravados no Brasil e nos EE.UU., sendo quatro deles exclusivamente dedicados à sua obra. Sua discografia em vinil também é expressiva.

 Ricardo já se alçou definitivamente ao primeiro nível dos compositores brasileiros modernos e presidiu duas vezes a Academia Brasileira de Música, fazendo duas administrações exemplares. Conheço-o há muitos anos e sei que ele nos dará uma excelente contribuição. Recebeu o título de Ex-aluno Ilustre do Colégio Pedro II, concedido pelo Conselho Superior e pelo Reitor daquele venerando educandário. É um homem culto, educado, afável, que certamente terá uma convivência muito agradável com seus novos colegas da nossa Academia.

 Maestro Ricardo Tacuchian: venha integrar a bancada nova da nossa entidade e se empenhe em renová-la, fortalecê-la e honrá-la. A Academia Brasileira de Arte muito espera de sua colaboração. Seja benvindo !

(Saudação feita pelo acadêmico Vasco Mariz a 26 de maio de 2014, na sala de eventos da Academia Brasileira de Música)


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